“O MONSTRO DO BANHEIRO”
POR JOEL MARINHO
Era madrugada, noite chuvosa quando Ravena saiu do trabalho e caminhou no destino que sempre fazia antes de ir embora da empresa a qual trabalhava já há cinco anos.
Primeiro ia ao banheiro tomar banho e trocar de roupas para depois tomar o rumo de casa onde dormiria até por volta das onze horas da manhã, hora de levantar e fazer seu almoço.
Ravena vivia sozinha naquela casa onde alugara desde que chegara do interior e passou a trabalhar na fábrica de sapatos.
Na noite seguinte Ravena não apareceu ao trabalho, logo preocupou seu chefe Reinaldo e amigos da empresa, pois seria a primeira falta durante os longos cinco anos de serviço, porém a noite ocorreu normalmente, afinal tudo tem uma primeira vez na vida e aquela seria a primeira vez que Ravena faltava.
As ligações para o celular não completavam!
Na noite seguinte veio o estranhamento, Ravena novamente não apareceu, então começaram haver as primeiras preocupações mais sérias. Nenhum sinal de celular, absolutamente nada.
A polícia foi acionada para fazer as primeiras investigações. Começou dentro da própria empresa, ninguém vira Ravena saindo naquela noite, apenas Rosa falou ter visto ela indo para o banheiro, foi a última pessoa que teve contato direto com ela.
A polícia se dirigiu até a casa de Ravena, foi necessário arrombar uma das janelas para poder acessar o interior daquela residência, onde a dona morava em um bairro próximo e acompanhou a operação policial.
Nada de diferente, nenhum sinal de arrombamento, nada revirado, estava perfeitamente tudo no lugar o que indicava uma organização exemplar daquele menina de apenas vinte e cinco anos, sem filhos, sem namorado e parentes distantes daquela cidade.
Os dias se passaram, assim como a angústia dos amigos de trabalho. Reinaldo, seu chefe direto andava também preocupado demais com aquele desaparecimento e pediu a polícia para fazer o máximo possível e reencontrar a sua operária, uma das mais exemplares.
Os dias passaram e a preocupação se tornou angustiante.
Depois de quinze dias do ocorrido a polícia trabalhava com diversas frentes de investigações, sequestro, assassinato, abandono de trabalho, entre outros.
No dia que completou exatamente um mês do sumiço de Ravena, Carla saiu para casa e não apareceu no dia seguinte, a última vez que a viram foi indo ao banheiro e daí o sumiço total.
Da mesma forma que Ravena não ficou nenhum vestígio, então a polícia fechou numa linha de investigação mais voltada para um assassino em série, logo a notícia se espalhou pela cidade e o medo coletivo tomou conta da população.
Nenhuma resposta pela polícia, nenhuma pista do sumiço de Ravena e Carla.
Reinaldo, homem sensato e cuidador de seus funcionários, dono daquela empresa “Pés Calçados” parou por um dia a produção para que os seus 98 funcionários que haviam sobrado pudesse descansar e ajudar procurar as duas moças sumidas.
No dia seguinte a polícia foi até o escritório de Reinaldo apresentar-lhe alguns detalhes da investigação e dar uma resposta a empresa e a sociedade em geral.
Perceberam que haviam coisas em comum entre as duas moças as quais colocavam nessa linha investigativa de que um psicopata estaria agindo dentro da própria empresa, as duas vieram de locais distantes e residiam anteriormente no campo com nenhum parente na cidade. Naquele momento já haviam parentes que vieram dos lugares de origem das duas e acompanhavam as investigações mais de perto carregados de muita angústia.
O que aconteceu com as duas?
Eis a pergunta que andava de boca em boca na cidade.
Passaram-se três meses desde o primeiro sumiço quando aconteceu o terceiro, agora de Maria Clara, trinta anos, sem filhos e de origem campesina, sumiram todas da mesma forma sem deixar nenhum vestígio.
A polícia passou a investigar diretamente dentro da empresa.
Em menos de uma semana já haviam sumido mais duas funcionárias, Angelina e Mônica.
Reinaldo cogitou em fechar a fábrica, reuniu todos os seus funcionários e como era um chefe que acatava a decisão de seus funcionários até certo ponto, quis ouvir a opinião deles.
Alguns foram de acordo com a ideia do chefe de fechar a fábrica, a maioria, porém não, visto ao grande número de desempregados naquela cidade e caso isso acontecesse eram mais pessoas sem emprego.
Mas qual o mistério do sumiço daquelas moças?
A investigação avançava e quanto mais os funcionários eram investigados, menos se sabia sobre os sumiços.
O delegado João Ovídio, chefe da investigação passou a perceber o comportamento de um funcionário de Reinaldo, um senhor de 53 anos, seu Antonio Caldeira, solteiro, pouca fala e que também tinha origem interiorana. Seu olhar desconfiado levantou suspeita e o delegado resolveu investiga-lo na delegacia.
Em seu depoimento pouca coisa foi coletada, apenas falou que vivia sozinho e não tinha uma relação muito próximo as moças, mesmo assim deixou algumas lacunas quando disse ter uma paixão avassaladora por Ravena, todavia nunca teve coragem de falar isso a ela com medo da rejeição, pincipalmente pela diferença de idade.
Sem provas concretas o homem não foi indiciado, mas o delegado ficou observando mais de perto os seus comportamentos.
João Ovídio foi até a casa de Antonio Caldeira e encontrou diversas poesias escritas por ele com uma assinatura estranha, se identificava por A. RV. Aquilo intrigou o delegado, mas nada de concreto que incriminasse Antonio.
Na volta para casa naquele dia um terrível acidente tirou a vida de João Ovídio, seu carro perdeu o controle e ele bateu de frente a uma mangueira centenária que havia no caminho da casa de Antonio para a casa dele. Faleceu ali mesmo.
Assumiu o caso outro delegado, Jackson Lira que fora destacado de outra cidade para dar continuidade àquela terrível investigação.
Ao chegar a fábrica fora recebido pelo distinto Reinaldo e pediu para averiguar todos os compartimentos daquele lugar. Percebeu que havia câmera em todos os departamentos, menos no corredor que levava ao banheiro feminino.
Intrigado com aquilo perguntou a Reinaldo porque não havia ali uma câmera. Reinaldo o falou que devido a não querer constranger as moças ele preferiu não colocar câmeras naquele corredor.
Quinze dias após assumir o caso, Jackson Lira teve aquilo que queria. Foi colocado no corredor do banheiro feminino uma câmera, já que todos os sumiços foram justamente após as moças irem ao banheiro.
Juntou todas as investigações anteriores e notou outro fato em comum ainda não descrito em nenhum documento, as moças sumidas eram todas negras.
Na manhã seguinte outro sumiço nas mesmas condições, dessa vez foi Áurea. O delegado Jackson observou que quando ela estava indo ao banheiro havia um colega o seguindo, era Gilson Gonçalves, 38 anos e já trabalhava na fábrica há 10 anos.
Gilson foi indiciado e levado para a delegacia onde confessou ter acompanhado a colega até a porta do banheiro, mas que não tinha nada a ver com o sumiço.
Averiguado a casa de Gilson foi encontrado um caderno com o nome de todas as moças funcionárias da fábrica o que o colocou como principal suspeita das ações, logo pedido sua prisão preventiva.
Após a prisão de Gilson os sumiços deixaram de ocorrer, então a polícia passou a busca para solucionar o caso e dar uma resposta a sociedade no sentido de dizer aonde estavam as meninas ou ao menos os restos mortais das vítimas.
Gilson utilizou o silêncio o qual lhe era permitido e nada mais falou e as investigações continuaram. Reinaldo exigia do delegado uma resposta do que realmente acontecera dentro de sua empresa.
Gritos ecoaram do banheiro feminino, havia na empresa policiais de plantão e logo correram para lá. Camila, uma senhora de trinta e cinco anos havia caído e batido a cabeça na parede que dava para o fundo do banheiro. Encontrava-se desacordada devido a queda, foi socorrida e levada para um hospital onde foi aos poucos se recuperando.
Um dos policiais que atenderam a ocorrência verificou um espaço, uma pequena fresta na parede, bateu no azulejo e percebeu que ali havia um barulho diferente parecendo um espaço vazio por trás sem parede.
Chamou o delegado Jackson e relatou a descoberta.
Jackson então pediu para que Reinaldo permitisse fazer um buraco naquela parede. Um dos funcionários do escritório deu permissão ao delegado, já que Reinaldo não se encontrava naquele momento na empresa.
Ao bater na parede percebeu-se que havia uma espécie de passagem secreta ali que dava para um cubículo escuro e apertado. No final desse cubículo havia uma tampa de madeira que foi retirado pelos policiais e logo descobriram um enorme túnel.
Os policiais foram seguindo em meio a escuridão auxiliado pela luz de uma pequena lanterna e outros com a luz do celular.
No final do túnel havia uma porta e estava fechada com um cadeado o qual foi cortado com a ajuda de um alicate grande. O túnel media cerca de 300 metros e quando aberta a porta os policiais se depararam com uma cena horripilante. Ali era uma casa de prostituição onde as meninas eram drogadas, amordaçadas e obrigadas a fazer sexo com aqueles senhores.
Quando o delegado e seus comandados de arma em punho deu voz de prisão conheceu algumas figuras importantes da cidade, entre eles o prefeito, alguns vereadores e o próprio Reinaldo.
Todas as meninas sumidas estavam drogadas e com uma corrente no tornozelo, uma cena terrível e deplorável, a própria visão do inferno.
Libertadas daquele cativeiro foram levadas ao hospital e receberam os devidos tratamentos.
Enquanto isso Gilson foi retirado da cadeia e depois de uma série de exames foi descoberto um nível de esquizofrenia leve e o nome das colegas no caderno era porque ele gostava de escrever crônicas sobre o dia a dia das meninas da fábrica, assim como Antonio que escrevia poesias para aquele amor platônico e ainda assinava com as suas iniciais e as iniciais dela.
Aquele caso terrível ficou gravado na memória da população da cidade de Geripauana e Reinaldo ficou conhecido por todos como o “monstro do banheiro”, preso foi condenado a pena máxima. Todos os outros envolvidos na casa de prostituição clandestina também foram presos e condenados como conivente no crime de sequestro, estupro e cárcere privado.
Quanto as meninas tiveram suas vidas de volta, porém nem todas conseguiram superar por completo aqueles momentos de terror a qual passaram sob ameaças daquele senhor que parecia um chefe tão amável e preocupado com o bem estar de seus funcionários.
Após uma minuciosa investigação foi comprovado que o carro do delegado João Ovídio na verdade tinha sido sabotado a barra de direção quando ele esteve próximo de descobrir a passagem secreta no banheiro. Reinaldo resolveu “dar um jeito” no delegado e assim parecer que foi um acidente comum.