Joel Marinho
Entre letras e versos
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O JUMENTO QUE TINHA NOME DE GENTE
POR JOEL MARINHO
Não é de hoje que se conta anedotas de jumento, falam do bichinho de uma forma as vezes até pejorativa, mesmo existindo os defensores como foi o caso de Luiz Gonzaga em sua música na qual dizia que “o jumento é nosso irmão, ão, ão, ão, ão”. Mas a história que vou contar é verídica, na verdade eu não vi, porém quem viu não tem costume de mentir, por isso usarei essa fonte como um caso verídico, então vamos começar essa “viagem”.
- Fala aí, Josias, narra a nós essa história, já que foi você quem presenciou e era dono do jumento!
- Então deixe comigo, tudo o que vou falar é extremamente verdadeiro.
Pois bem, foi uma época em que eu morava em Camaçaru do Norte, Estado da Paraíba. Já se passaram muitos anos, porém aquele jumento que fez parte da minha vida foi o animal mais cretino e esperto por mim visto, por isso dei-lhe o nome de Francisclair, uma mistura de Chico com um nome francês, para vocês entenderem a capacidade de convencimento que o animal alcançou. Só faltou aprender falar direito. Na verdade ele falou, mas sempre com um sotaque puxado de jumentês, meio assobiando.
Eu fui a uma feira na intenção de comprar um burro já pronto e afeito ao trabalho, porém dei de cara com o jumento e logo ele me olhou como se tivesse sorrindo. Eu diria que foi amor à primeira vista. Ele ainda pequeno, mas quando o amor acontece não tem jeito, lá vou eu levando um filhote de jumento que não dava conta de carregar dez quilos de mandioca nas costas.
Mas enfim, fui embora devagar puxando ele até chegar em casa, onde coloquei no curralzinho que tinha atrás da minha cozinha.
A noite esse jumento chorava igual criança, o que me fez cortar o coração e assim coloquei ele para dentro de um alpendre o qual eu havia feito para proteger a parede da sala. Para que eu fui cometer esse deslize? Daí em diante o “bonitão” não dormia mais no curral, só no alpendre.
Ao longo do tempo Francisclair foi crescendo, ficando robusto e parece que foi também se tornando gente, aprendeu a roubar milho do vizinho e trabalhar não gostava muito não, talvez se aproveitava de tamanha intimidade que conseguiu desenvolver ao longo do tempo comigo.
Francisclair se tornou um jegue confiado por ter desenvolvido aspectos humanoides, inclusive de andar sem cabresto por todos os lugares.
Certo dia Francisclair desapareceu, chegou altas horas da madrugada cambaleando de porre. Havia invadido o bar de um vizinho e tomou trinta litros de cachaça pensando que era água, chegou em casa chorando e cantando Roberto Carlos: “Eu voltei, voltei para ficar, por que aqui, aqui é meu lugar...”
Foi um Deus nos acuda, tive que acordar de madrugada e dar um banho gelado no miserável para acalmar seu porre, além de fazer um café quente e sem açúcar para o confiado.
Francisclair me fez tantas e boas durante os seus 25 anos de existência.
Mais um dia Francisclair passou dos limites. Houve um comício na praça e o candidato a prefeitura do município começou a falar um monte de coisas e prometer até um terreno no paraíso para os seus eleitores. Como todo mundo conhecia Francisclair e sabiam que ele adorava uma cachaça, deram pinga para meu jegue e de repente o espírito do demônio começou a encarnar nele e aos gritos meio jumentês começou a berrar do meio do povo: - Seu mentirosooooo, ladrãoooo!!!
Na terceira vez o candidato já incomodado e P. da vida com aquilo retruca do microfone: - Ô animal, deixa de ser jumento, eu sou a melhor opção de voto! Porém o candidato não sabia que estava falando de fato com um jumento.
Quando ele percebeu com quem falava teve um ataque cardíaco e morreu ali mesmo sem chances para os paramédicos que foram acionados imediatamente.
Já meio chapado Francisclair pegou o microfone e fez um discurso inflamado, disse que seria o candidato dali em diante e prometeu dar cachaça para todo mundo caso fosse eleito.
Sem muita opção de voto e por conta de toda a corrupção nterior Francisclair foi eleito. Foi um acontecimento histórico na cidade de Camaçaru do Norte. Ele então passou a distribuir patadas a partir daquele momento, pois apesar de ter ganho as eleições não sabia falar direito e tudo para ele seria resolvido no pontapé e na patada, sua vontade era implantar um regime militarizado onde todos passariam a andar armado, porém seu intuito não foi concluído, pois no meio de seu mandato, Francisclair teve que ir às pressas fazer uma cirurgia e não resistiu.
Morreu Francisclair, mas fez discípulos e eu perdi o jumento, se bem que não fez muita falta mesmo, ele nunca trabalhou, principalmente depois que se tornou prefeito.
Lá se foram 22 anos desde a sua morte. Pouca gente lembra de sua existência, a não ser poucos saudosistas que ainda sonham com a volta de terem outro jumento governando a cidade com o intuito de liberar armas ao povo.
Essa História é a mais pura verdade, eu era dono do jegue e acabei sendo governado por ele, levado pela emoção acabei votando também em Francisclair, pois quando não há “crivo” (análise política) acabamos votando em qualquer jumento, afinal todos são iguais mesmo, a diferença está em: de que lado do curral o jegue está governando?
 
 
 
Joel Marinho
Enviado por Joel Marinho em 01/10/2019
Alterado em 01/10/2019
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