Joel Marinho
Entre letras e versos
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UMA PERGUNTA QUE SEMPRE ME FAZEM (A FAVOR OU CONTRA O ABORTO?)

JOEL MARINHO

Esse assunto é espinhoso, digo espinhoso em todos os pontos de vista porque envolve vida, morte, imaginário, família, religiosidade, sentimentos diversos, enfim, por vezes prefiro ficar neutro com relação a isso, porém quanto professor, agente público, escritor, pai, avô e acima de tudo ser humano vou deixar minha humilde opinião que em nada vai mudar a rotação da terra ou qualquer decisão social, mesmo assim vamos lá.

O assunto: ABORTO. Contra ou a favor? Eis a pergunta que vez ou outra me perguntam e eu sempre tento fugir dessa situação porque é algo difícil demais opinar.

Como eu mero ser humano posso ter peso de decisão na vida de outrem? Logo eu que quanto professor sou “proibido” em um país dito democrático falar sobre sexualidade e gênero em sala de aula, lugar que deveria ser o mais democrático de todos e um assunto que é tão iminente. Não, não tenho essa capacidade de dizer sim ou não para o aborto. Não posso dizer a uma mãe desesperada que acreditou em um irresponsável qualquer a não cometer esse ato tão reprovado pela maioria da sociedade e nem posso ir atrás do infeliz para fazê-lo assumir um filho o qual já desprezou antes de nascer, assim como não tenho nenhuma capacidade de cuidar dessa criança após seu nascimento e dar-lhe todo aparato possível para crescer em paz. Aliás, qual seria a paz a quem já nasceu desprezado?

Agora sim, se me perguntarem se eu sou contra em fazer o aborto de uma criança que eu por irresponsabilidade ou por descuido fizesse eu jamais compactuaria com um aborto, mesmo que isso pudesse por exemplo me custar qualquer coisa material. Assumiria meu “B.O” e assumiria a minha responsabilidade quanto pai, isso sim eu teria o controle de fazer.

Por falar nisso, resolvi depois de anos contar a história da minha vida sobre aborto o qual não aconteceu e mesmo que envolvam outras pessoas penso que pode até ser inspiração a outras, pois teve um final de certa forma feliz.

Eu o ano de 1993, eu aluno da sétima série, completando 18 anos conheci a pessoa que foi a primeira parceira de vida com quem vivi quase 20 anos e tivemos três filhos. Quando a conheci e começamos ter os primeiros contatos de beijos ela me comunicou que estava grávida do seu ex-namorado e ele havia dado um dinheiro a ela para fazer um aborto. Entre choros e lamentos perguntou se eu a ajudaria nesse intento, como nem pensava em ter filhos e ser casado imediatamente disse que sim e assim acertamos para procurar uma clínica para fazer o tal serviço.

Fui para casa aquela noite e dormi tranquilo. Por volta de umas duas horas da manhã acordei muito assustado e sem conseguir parar de chorar com aquele sonho o qual mudou toda a trajetória da minha vida, a que sempre pensei, estudar, fazer faculdade, comprar minha casa e morar sozinho, mas aquela criança recém-nascida olhava fixo em meus olhos naquele sonho e dizia: “PELO AMOR DE DEUS NÃO ME MATA”!

Acordei assustado e chorando e não consegui dormir mais. Fui trabalhar no outro dia, talvez o que tive a sensação do mais longo em minha vida, só queria a volta da noite para encontrar a pessoa e conversar.

Lá já com ela fui direto e até grosso, disse que não iria mais ajuda-la com aquilo, até porque nada daquilo era problema meu, mas prometi ajudar no processo da gravidez até a criança nascer. É, fui bobo ao “brincar de amor com uma mulher”, mas sábio em não brincar com o amor de uma criança e assim fomos nos acomodando. Eu acompanhando a gravidez, vendo a barriga crescer, me encantando com aquelas mudanças fui me enlaçando e ficando. Depois ainda por muito tempo o que não vem o caso aqui.

Muitas vezes fui chamado de otário, japiim, entre outros termos pejorativos por criar o filho dos “outros”, mas não era dos outros, ela era, é e será sempre a minha querida e linda filha a qual tenho amor e muito orgulho de tê-la por filha assim como tenho pelos outros dois que vieram depois, amo-os da mesma forma, assim como amo meus netos já filho dela e do meu filho.

Por vezes fico me perguntando o que seria de mim quanto ser humano hoje se tivesse ajudado fazer aquela atrocidade? Como seria a minha consciência hoje quanto ser humano e quanto a minha espiritualidade? (Quando falo de espiritualidade não falo de religiosidade), do meu ponto de vista são duas coisas totalmente diferentes e adversas.

Enfim, falar minha história pessoal é não defender o aborto desse ponto de vista, exclusivamente do meu e não do outro, visto que cada um carrega seus traumas e carmas, aliás, por vezes ouço defesa do não aborto pelo ponto de vista religioso de que é pecado e a pessoa que o fizer vai para o inferno, outra coisa que está fora do meu controle e de todos, visto que a pregação é de uma salvação pessoal e intransferível, se assim for como eu irei apontar o dedo aos outros? Às vezes fica entendível essa ótica religiosa, mas também isso eu não posso controlar.

Dessa forma se alguém me perguntasse de maneira seca, rasa e descontextualizada se eu sou contra ou a favor do aborto eu não titubearia e diria: CONTRA. No entanto, há tantos contextos, tantos conceitos, tantos sofrimentos, tantas amarguras, tantas doenças físicas e mentais, tantas irresponsabilidades, tantas faltas de entendimentos, tanta falta de conversa dentro das famílias, tantas fantasias. No meio disso tudo nem “tanto” eu sou, apenas um grão de areia em meio a tantas coisas.

E quem é contra o aborto por acaso arcaria com a responsabilidade de cuidar de uma criança até a idade adulta dela caso nasça e não tenha quem cuidar ou só iria para as redes sociais fazer postes de textões xingando e julgando a vida alheia?

Mas tu não é a favor da vida?

Tão a favor que criei três filhos e ajudei a criar outros que nem meus filhos são e não hesito em ajudar a outros, porém não tenho tempo e nem dinheiro para isso, por esse motivo prefiro não me meter na decisão de vida de ninguém e deixar que cada um cuide da sua própria vida sem a minha interferência onde eu não fui chamado para opinar.

Desculpem se os desapontei, meus leitores, mas aos que me perguntaram e gostariam de saber minha opinião é essa, não quero julgar ninguém nem apontar certo ou errado, só penso que para se colocar um filho no mundo precisamos de discernimento, um pouco de dinheiro, um ótimo psicológico e muita responsabilidade.

Com relação a minha história, apesar da enorme responsabilidade que tive de assumir, das conquistas pessoais tardias eu tenho muito orgulho do que não fiz, ajudar em um aborto. Tenho muito orgulho em ter minha filha e apesar de hoje estarmos distantes um do outro receber um “eu te amo, pai” valeu por todo e qualquer esforço que fiz para ver o sorriso dela.

Joel Marinho
Enviado por Joel Marinho em 27/09/2023
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