Joel Marinho
Entre letras e versos
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MALDITA PALMATÓRIA (Diferença de Educação e Medo)

JOEL MARINHO

Eram dias difíceis aqueles para a educação formal escolar. Poucos recursos existiam tanto para professores responsável por uma turma de multisseriado quanto para alunos, por exemplo, caderno, lápis, caneta, livros eram coisas de luxo e para quem nasceu no “Cafundós do Judas” como eu seria impossível ter um caderno, tudo era feito com aquelas páginas soltas cortadas em quatro partes e costuradas com linha de costura pela minha mãe que completava o quite com um lápis que nele havia a tabuada de multiplicação e uma borracha em uma de suas extremidades e tinha que durar ao menos seis meses, dava uma pena cortar para renovar a ponta e lá se ia nossa “cola”.

Mas era um sonho tão lindo os primeiros dias na escola, a descoberta das letras, a formação das frases, a lição de leitura lida em frente a professor, os colegas de classe. Ah, quanta delícia rememorar esses momentos lindos mesmo em meio a tanta falta de recursos.

Bem, mas havia uma coisa a qual eu detestava, a tal de palmatória feita por meu pai e dada de presente a professora com uma boa recomendação:

- Se meus filhos vacilarem pode “mostrar” essa belezura batizada por “respeito” feita de massaranduba com muito carinho para a escola.

As horas que se aproximava daquela velha sabatina de tabuada tornava-se um momento de terror para mim, a mão gelava, o coração disparava, a ansiedade batia e com isso vinha a grande vontade de chorar a qual tinha de disfarçar, afinal de contas o discurso do macho alfa era que “homem não chora”, portanto engolia o choro e esperava o momento de terror começar.

Decorei aquela maldita tabuada, pois queria me livrar da dor dos famosos “bolos” de palmatória quando errava a pergunta feita pela professora. Com o tempo aquilo foi se tornando habitual a mim, passei a seguir a lógica da “porrada” para aprender e me deliciava quando acertava a pergunta, era minha vez de bater como uma forma de vingança em alguém e sentir o prazer pela dor do outro.

Que coisa triste, aquele sistema malicioso que transformava o ser humano em uma máquina de tortura acabara se tornando essencial para libertar as minhas frustrações da mesma forma observada por mim nos olhos da professora quando toda a turma errava e ela nos chamava em fila indiana um a um para aliviar toda a sua ira nos machucando as mãos e causando dor sem nem se levantar de sua cadeira.

Aquilo de certa forma trouxe alguma coisa positiva para a minha pessoa, fui estudar História para entender como aquela tortura bizarra se tornava prazerosa para quem praticava causando dores em outrem, principalmente quando se tratava de causar dor física e psicológica em uma criança, trazendo danos terríveis e por vezes irreversíveis.

Então era isso que sentiam os padres que torturavam suas vítimas muitas vezes até a morte durante todo o período inquisitorial, o prazer da dor vista nos olhos dos outros quando estavam em vulnerabilidade diante de uma autoridade?

Mais tarde já estudando Psicologia foi então que percebi a coisa mais a fundo. Ao causar dor em alguém desconto no outro todas as mágoas e dores da vida a qual eu também fui submetido e assim momentaneamente sinto alívio e prazer, sobretudo, quando estou em um cargo de poder onde eu possa justificar isso como estando fazendo algo bom e assim saio ileso sem o peso na consciência, por isso não julgo mais hoje quem fez isso comigo, afinal era apenas mais uma pessoa frustrada que vinha em cadeia no efeito manada.

Sei que haverá muitas críticas com relação a esse meu texto e alguns dirão: “Mas naquele tempo era melhor, os meninos respeitavam os seus professores”. Talvez porque quem assim pensa não entendeu a lógica da diferença dos conceitos entre “educação” e “medo”. O medo causa pânico, cinismo, hipocrisia, frustração, violência, ansiedade, depressão, entre outros, já a educação torna uma sociedade mais tolerante, feliz e amorosa uns com os outros. Isso é lógica, a criança só aprende o vivenciado na prática, poucos são os que consegue por si só buscar outras alternativas diferente de sua vivência no dia a dia enquanto criança.

Ah, também não posso esquecer na criação e educação atual, jamais me esquivaria de tocar nesse ponto espinhoso, pois quanto professor e psicólogo percebo uma liberdade exacerbada por parte de pais que por terem se frustrado e querendo proteger os filhos de todas as formas acabaram liberando total, logo causando um outro problema, o pensamento dos jovens de “tudo posso”.

Costumo dizer e afirmo: qualquer que seja os extremos é maléfico às sociedades humanas, nesse sentido a criança precisa entender haver um comando, pois precisamos quando organização de sociedade seguir a lógica da hierarquia, porém uma hierarquia capaz de difundir a educação como sendo uma forma de libertação do espírito para a criação de artes, tecnologia e acima de tudo, respeito ao outro sem a angústia do medo.

 

 

Joel Marinho
Enviado por Joel Marinho em 17/07/2024
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