FRISSON PELO ESPETÁCULO DOS HORRORES
POR JOEL MARINHO
Não é de hoje que o ser humano se sente maravilhado diante a cenas de horror que cause dor no outro, quanto mais horrível e dolorosa possa ser a desgraça alheia mais espetacular se torna para a maioria dos seres humanos e isso não surgiu de agora.
Quando estamos estudando a história do mundo antigo nos deparamos com cenas lamentáveis e extremamente cruéis como a luta dos gladiadores quase sempre acarretando a morte daquele que perdia a batalha dentro das arenas. Quando o perdedor ainda estava vivo o imperador tinha o poder de matar ou deixar viver, bastava um sinal positivo ou negativo com o dedo polegar para determinar o fim de quem perdia ou a continuidade do sofrimento, visto que ao se recuperar iria novamente para outras lutas.
Aquele espaço de tempo em que o imperador fazia suspense deixava a plateia de milhares de pessoas extasiada, loucas para ver o grand finalle.
Também fazia parte do espetáculo quando cristãos eram postos no meio da arena enquanto leões famintos eram soltos para satisfazer saciar suas fomes com carne humana que lutavam desesperados para não morrer, isso levava a plateia ao delírio total, uma espécie de gozo coletivo por meio da desgraça alheia.
Nossa, que triste momento da história humana, dizem muitos que ao terem contato com a história antiga expressam. Que seres humanos eram nossos ancestrais capazes de se divertir com tamanha desgraça? Ainda bem que a geração do século 21 não admira mais esse espetáculo de horror de dois mil anos atrás, pois o nosso nível cultural está muito além do que já fomos quanto humanos, nossa civilização e cordialidade não nos permite mais reverenciar esse horror.
Bem, que evoluímos um pouco mais isso é verdade, mas essa evolução parece não ter sido tão acentuada assim, pois se analisarmos do ponto de vista crítico os acontecimentos atuais chegaremos a conclusão que o que nos separa dos romanos de dois mil anos atrás são apenas as práticas de consumir esse espetáculo dos horrores.
Para constatarmos isso basta fazer uma “navegação” pela internet da vida, lá encontraremos diversos vídeos de pessoas morrendo de forma trágica e alguém com um aparelho celular nas mãos registrou para posteriormente ganhar like e quem sabe até dinheiro com isso. O mais impressionante é que quando vamos ver o número de acessos chega a ser milhares ou milhões.
Com o desenvolvimento da cultura digital registrar e acessar a desgraça alheia se tornou muito mais fácil e rápido, logo qualquer acontecimento que coloque alguém em uma situação vexatória vai estar lá um monte de gente filmando, divulgando e assistindo as cenas horrorosas. Se alguém morreu com diversas facadas ou tiros ou apanhou até a morte, quanto maior é a simbologia da desgraça maior será o alcance desse impacto.
Vendo essa situação voltamos a questão anterior e surge uma pergunta fácil de ser respondida: será que realmente evoluímos no sentido de termos nos tornados mais sensível e cordial com as coisas humanas?
A resposta é seca e direta: Não!
O que mudou na verdade foi a forma como nos “deliciamos” com a desgraça, no período da Roma Antiga para presenciar tais cenas precisavam ir até o local das lutas, o contato era direto e todo mundo estava ao mesmo tempo vendo o sorriso no rosto um do outro ao ver o sangue tingir de vermelho o tapete branco de areia das arenas, hoje com o celular nas mãos moldado por uma tecnologia cada dia mais realista podemos ver em nossos aposentos sentados ou deitados em câmera lenta e quantas vezes quiser com a ajuda do zoom para enxergarmos melhor aquele coração pulsando seus últimos estímulos elétricos.
Quando analisamos isso de maneira mais densa por vezes vem a pergunta: será que somos uma criação que não deu certo ou fomos criados para sermos mesmo admirador de nossa própria desgraça quanto ser humano? Isso talvez será um mistério humano que nunca vamos descobrir? Ou talvez seja um triste instinto que nem as convenções sociais seriam capazes de extinguir?
Mesmo com todas essas perguntas sem respostas ainda acredito na mudança de sensibilidade humana para talvez um dia podermos usar o conceito de empatia tão utilizado hoje quanto discurso, discurso esse a meu ver ainda muito vazio e por vezes até hipócrita.